Recuperando Projetos Problemáticos
A primeira pergunta, na verdade, seria: “Queremos realmente recuperar esse projeto?”.
No post anterior, vimos alguns sinais que podem caracterizar um projeto problemático. Neste post, incluímos novas referências e fontes de pesquisa sobre o assunto, buscando aprofundar a identificação e a recuperação de projetos problemáticos, bem como oferecer dicas de prevenção para o post seguinte.
Todo projeto é um desafio. São empreendimentos temporários sujeitos a grandes variações devido a fatores internos e externos, tais como:
- Requisitos incompletos
- Escopo mal definido
- Expectativas não realistas
- Conflito entre stakeholders
- Condições de mercado
- Capacidade técnica
- Disponibilidade de recursos
O contexto de complexidade, incerteza e velocidade que permeia os projetos faz com que gerenciar um projeto seja sempre um desafio. Na figura a seguir, observamos que é natural haver algum desvio entre os objetivos traçados originalmente (challenged). Entretanto, quando esses desvios são maiores que as tolerâncias estabelecidas nos planos, termo de abertura ou business case, o projeto passa a ser problemático (troubled).
Figura 1 – Variância entre objetivos nos projetos (ESI, 2007)
O monitoramento e controle do projeto, não apenas nos seus aspectos técnicos (escopo-tempo-custo, valor agregado etc) mas também sob a ótica de negócios (valor, benefícios) e de stakeholders (satisfação, expectativas) é essencial. A identificação precoce de um projeto problemático permite sua recuperação com maior índice de sucesso. À medida que o projeto se torna crítico e fracassado, ele entra na zona de terminação. Isto é, é mais saudável finalizar o projeto, pois o custo-benefício de recuperá-lo não vale a pena.
Neste post, nossa atenção é para a zona de identificação (asssessment & recovery). A seguir, temos uma figura com alguns indicadores de que o projeto está se tornando problemático.
Figura 2 – Indicators of troubled projects (VARGAS, 2007)
Recuperar um projeto não significa necessariamente conseguir trazê-lo para seu plano original, muitas vezes isso não é possível. Precisamos compreender que a recuperação de projetos está preocupada em salvar o que restou de benefícios / valor no projeto, dada sua situação atual. Muitas vezes, o plano de recuperação necessita de cortes ou ampliações na tripla restrição inicial (escopo-tempo-custo).
Figura 3 – Rapid assessment and recovery process (ESI, 2007)
O processo de avaliação e recuperação de projetos problemáticos proposto pela ESI (2005, 2007) envolve duas fases, que devem ser planejadas adequadamente. O primeiro passo, na fase de avaliação é Definir Charter (Termo de Abertura):
- Definir objetivos juntamente com o patrocinador e outros stakeholders-chave, se houver
- Analisar e compreender o histórico do projeto
- Mobilizar a equipe de avaliação (assessment)
- Definir a abordagem de avaliação
Posteriormente, é feita a avaliação da situação atual do projeto, com base no plano de assessment e abordagem escolhida, para que seja possível propor um plano de recuperação ou então propor o encerramento do projeto, como resumido na figura seguinte.
Figura 4 – Troubled project assessment model (ESI, 2005 apud VARGAS, 2007)
Antes de propor o plano de recuperação, é preciso tomar uma decisão GO-NO GO. Será que é interessante recuperar o projeto problemático? Devemos sempre lembrar que não se trata de diversão nem de honra. Trata-se de negócios, valor e benefícios. Algumas questões:
- Quão importante é o projeto?
- Quais são os benefícios prometidos pelo projeto? Quais as chances de entrega desses benefícios?
- É possível prosseguir com pequenas mudanças ou devemos redefinir todos os objetivos e planos do projeto?
- Quais são os impactos do projeto em outras áreas organizacionais ou outros projetos? Quais suas interfaces e dependências?
- Qual é o montante de recursos necessários para recuperar o projeto? O custo-benefício da recuperação se justifica?
- Os stakeholders apóiam a recuperação do projeto?
- O gerente e a equipe estão motivados para recuperá-lo?
- Existe um patrocinador com autoridade e vontade para recuperar o projeto?
- O contexto do projeto, condições de negócio e mercado são favoráveis à recuperação?
- Existe algum obstáculo instransponível para a recuperação?
Após responder essas e outras perguntas, com base nos resultados do assessment, se a decisão for favorável à recuperação do projeto, é preciso planejar sua recuperação. O plano de recuperação pode ser desde uma simples redefinição / remodelagem do plano inicial, ajustando escopo-tempo-custo, por exemplo, ou pode envolver novos estudos de viabilidade e um plano de projeto bastante diferente do original.
Figura 5 – Conducting the recovery process (ESI, 2007)
Em se tratanto de um projeto problemático, sua recuperação merece grande atenção e controles. O gerente do projeto e o patrocinador, particularmente, precisam ser proativos na solução de problemas e na resolução de conflitos. Estabelecer responsabilidades de maneira clara e objetiva é essencial. Além disso, deve existir um sólido plano de comunicação para garantir o apoio dos stakeholders principais à recuperação do projeto. Agilidade nas decisões também é um fator preponderante para o sucesso.
Finalmente, eu diria que podemos caracterizar a recuperação de projetos como um wicked-mess problem (HANCOCK, 2010). Isto é, trata-se de um problema dinâmico e divergente. Dinâmico porque os fatores comportamentais dos stakeholders demandam alto nível de habilidades em relacionamento, facilitação e negociação. Divergente porque a complexidade técnica é alta, exigindo grande habilidade em pensamento conceitual e sistêmico.
Neste tipo de problema (wicked-mess), quanto mais estudamos o problema, maior o número de soluções que encontramos. Ou seja, não há convergência nem linearidade devido às incertezas e complexidades. Por isso, é preciso ter foco nos key success factor, definir e delimitar muito bem os objetivos da recuperação e nos atermos a eles. Por outro lado, devemos ter grande cuidado no gerenciamento dos stakeholders, cujo apoio e suporte é um fator extremamente crítico para o sucesso da recuperação.
No próximo post, relataremos um pouco da nossa experiência pessoal em participar de projetos problemáticos e em trabalhar na sua recuperação. Na próxima semana, retomaremos o assunto, incluindo dicas de prevenção que podem diminuir as chances do seu projeto se tornar problemático. Até lá!